segunda-feira, 16 de novembro de 2015

traditore




as palavras me cansam
pois são dum texto inúmeras vezes dito
ou pensado
enquanto espero

se eleva dentro o que não tem voz
voz na voz, voz no corpo
vai sendo carregado
com sua forma inconstante

vai querendo ficar perto
ensaiando e aprendendo
a conjugar as pausas
e a imaginar o que virá depois delas

pausas sem ritmo
pulsam o ir e vir
como o que não se ignora
por pertencer

rascunhos breves
estes guardados
valem mais que livros

tem língua própria
o não dizer




domingo, 15 de novembro de 2015

sobrenome






José ou João
tanto faz...
trocou o lugar na mesa
trocou a esperança pela hora do almoço
o prazer dum beijo pelo sabor do café, depois de comer
trocou os pensamentos pelo sono,
sem se lembrar dos sonhos
enterrou suas questões como se enterra um pássaro
e se tiver nele, em seu intestino, alguma semente,
que brote ao acaso
como as plantas que nascem entre concretos
trocou o ser pelo que já é
sem se importar com o nome
deixou o juízo para os outros
deixou de se inventar
para transformar as respostas em meros sons
barulho de chuva, de riachos
de folhas no vento
de máquinas ou instrumentos
perdeu a condição de ator
transferiu-se de Édipo para esfinge
desvelou suas roupagens
para ficar mais leve que o lençol
para cuidar dos instantes
no tamanho deles

como tem Zé no mundo!
como tem João
e poucos o são