segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Auto da Gamela

O Auto da Gamela, texto de Esechias Araújo Lima e Carlos Jehovah, com direção de Roberto de Abreu, firmou uma temporada em nossa cidade e revelou aspectos que considero relevantes, em se tratando das artes cênicas e seu espaço no contexto cultural de nossa região. Em primeiro, revelou que o público vai ao teatro. Mas para isso, é preciso investimento midiático para que as pessoas tomem conhecimento do espetáculo, observando que não basta a simples informação, tem que ter elementos visuais que passem uma centelha do que “vão ver”. Mas devemos considerar que o nosso público não tem um hábito frequente de ir em busca de notícias culturais. Essas é que têm que chegar até o público. Em segundo, é que um bom espetáculo garante o êxito de sustentar uma temporada, gera interesse com a boa execução, ressaltando que o grupo Finos Trapos é formado por profissionais (Daisy Andrade, Danielle Rosa, Polis Nunes, Roberto de Abreu e Yoshi Aguiar) dedicados que foram reconhecidos pelo mérito próprio de seus esforços. Em outras palavras, mídia não faz artistas nem bons espetáculos, estes mesmos é que se fazem.


Os Autos tiveram sua origem desde o sec. XII com a interpretação de textos que se fundamentavam em momentos da trajetória dos santos, profetas, da paixão de Cristo, sendo muitos deles usados na catequese dos “bárbaros” (das raças sem alma tão massacradas pelo interesse econômico camuflado incovenientemente de religião) e, não obstante, foram sem sombra de dúvida suporte importantíssimo para formação do que mais tarde seria conhecido como ópera, em finais do Sec. XVI início do sec. XVII.


A realização da peça, sob a direção de Roberto de Abreu, se nos mostrou com um domínio seguro da direção, no que não permitiu espaço ao desvio da atenção por algum cansaço. Ao contrário, nos prendeu pela variedade de composição de cenas, pela performance individual dos atores e pela forma como o diretor manteve uma dinâmica consistente a cada quadro. Percebemos claramente aspectos de diálogos que transcenderam ao palco e ao texto do Auto em si, não encerrando a obra em sua própria forma, mas permitindo alguns fluxos próprios de momentos breves de livre desenvolvimento dos personagens. Forma esta já conhecida, porém, nem sempre se consegue êxito simples e direto como neste trabalho. Os atores não se intitulam cantores, mas conseguiram nos passar muito bem os cantos com todos os requisitos para o espetáculo. As composições realizadas pela equipe são de fácil assimilação e se adequaram bem na unidade do espetáculo. Por outro lado nos mostraram que trata-se de um verdadeiro grupo que funciona como um organismo integrado. Seria um excelente exemplo de uma micro empresa cultural na qual todos estão no mesmo barco, verdadeiramente. Espero que Conquista tenha sido um bom porto para ancorar a nau desses nossos conterrâneos brilhantes.