O Pote
E tava passando o cortejo...
Passando bem na frente da casa de seu Leôncio...
Todo mundo acompanhando e carregando o defunto, carregado na rede pendurada num varão que ia de ombro a ombro, e que não podia de jeito nenhum escorar no chão. Só na cova onde fosse plantar o defunto, senão o lugar onde tivesse pousado ficaria assombrado!
E pra “plantá” os defuntos tem que ter “ciênça”. Não pode ser em fileira feito as covas de maniva de mandioca não, senão todo dia tem gente morrendo que não chega! Tem que ser um num canto, outro no outro, outro no outro... Em cruz.
Aquelas bandas era região onde sempre passava Jagunço, Cangaceiro. Os revoltosos! Tinha os que apoiava eles e outros que não. Seu Leôncio era um que não apoiava e sempre tinha intriga de Jagunço atrás dele. Mas eles não conseguiram matar o seu Leôncio não. Ele morreu do coração. De morte natural.
Mas conta que uma certa feita dois Jagunços vieram pousar na casa de seu Jesuíno, que costumava apoiar esses cabra, que em troca não fazia nada com ele, nem nas terra dele. Já era do conhecimento deles que seu Leôncio possuía uns colares de ouro e que costumava enterrá-los dentro num pote pra ninguém achar, nenhum Jagunço, ninguém! Nem os familiares. E diziam também que ele “invultava”. Invultava que ninguém via...
E esses dois Jagunços rumaram pras banda da casa de seu Leôncio no cair da tarde, com a intenção de capturar seu Leôncio e fazer ele dizer onde estavam os colares de ouro, o Pote.
Conta que quando foram chegando, a mulher dele que tava na porta, recebeu uma cusparada de balas que passou raspando a criança que ela tinha o colo. E a porta já era “rendada de bala” de tanto Jagunço que já passou por lá com as mesmas intenções.
Seu Leôncio, na mesma da hora pegou uma capa preta de invultamento, se cobriu e invultô!
Sumiu que ninguém viu...
Conta uns que ele se escondia numa gruta lá perto da Pedra Branca, que tinha as paredes rosadas e cheio de uns rabiscos.
È! O cortejo de enterro, que me esqueci de dizer, era do seu Leôncio, que morreu do coração, enquanto plantava mandioca. Morreu com uma maniva na mão.
Não sei se o pessoal que tava carregando deixou o corpo arriar no meio do caminho, mas só sei que tem uma Aroeira velha no meio da estrada pro cemitério que nas noites, o povo costuma dizer que seu Leôncio aparece pra assombrar os passantes.
Será que foi lá que onde escondeu o Pote?
2 comentários:
Lembro-me do cenário em que foi construída essa história. Primeiro uma sala simples, de piso de chão batido. Duas senhoras negras e o universo da memória.
Depois uma senhora branca, numa casa de roda, tirando goma... ela contava, contava e mirava o horizonte... ela reviveu os tempos de criança quando ouviu as histórias... histórias dos tempos idos... dos tempos de criança.
Foi muito bem escrita por ti!
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