domingo, 28 de setembro de 2014

Temblores





será assim
quando a grande conspiração esperada
imaginada em suas drásticas consequências, chegar enfim
no momento que romper a madrugada
e só haver passarinhos e folhas dançando
e um silêncio cotidiano rompendo-se pouco a pouco
no acordar a cidade
será apenas assim

a ideologia se tornará ser humano
e o palácio tornar-se-á casa e cozinha
a voz recitará os versos ensaiados
textos sem improviso
de ensaístas, historiadores, psicólogos
e de jogadores experientes

será como a pia suja na manhã seguinte
ecoando os encontros e a solidão
com resto de delícias e desenhos impensados
a um passo da coragem para o trabalho da recomposição da ordem
e a inconsciência de um Pilátos de bucha e sabão

melhor querer ter pés de areia fina
para cruzar o rio sem se esperar na outra margem
liquidar os caminhos traçados para algum ideal
desejar ter mãos que sonham pensando serem nuvens
e serem apenas gestos, estarem acima das coisas
pra resplandecerem em outro rosto
serem vistas de longe

desejar não saber como será
se rosto em sombras ou mãos plúmbeas
sujas ou ensaboadas
se apontando pássaros ou catando folhas para guardar
nos cadernos entre folhas vazias

apenas pensar leve
e esquecer todas as possibilidades de como será no instante que for
assim, fora dos textos e da memória
no equívoco, na surpresa
no adjetivo mais que no verbo

num imponderável esforço de ser










terça-feira, 9 de setembro de 2014

neblina





Imensa nuvem cinza
Estendia-se por todo céu
Em neblina

À rua, descoberto, ouvia a canção francesa num jeito blues
Estranhava tudo e cada justa coisa
Obviamente como deve ser cada coisa
Imperiosa e indiferente

funcionalidades tantas
em tantas coisas
e sempre a falta essencial
de uma estória que as conte
e as inclua como cenografia
sem deixar de lado a menor das coisas

mas ainda ali
no inverso da vontade
por todos cantos vasculhados naquela noite
competindo com as infindas gotas sem sal

olhar apertado
o canto se extinguindo  um pouco para fora daquele lugar

Não era a versão que preferia
Mas era a canção
Não é assim que se deve viver
Mas é assim a vida...

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Pluma






é apenas humano
ajuntamento...

é preciso, contudo
não confrontar extremos
sala a dentro

de porta aberta, porém,
a permanência, generosa e tão maior,
acerca-se nos esquivos

em cada um
a permissão ainda é um limite
às vezes do invasor
ora do invadido
ou d'um demasiado observador

íntimo e desconhecido
rendido humano entre tu e outro
seu corpo sabe
seu pensamento deflora

ainda assim, algum tipo de dor
te ensina o alívio de viver
negar ou calar-se
e atravessar
inevitavelmente...