segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

inútil




se eu tivesse mais cuidado
não teria ido
não teria visto
nem encontrado

tudo seria mais trivial
dormiria sete horas
faria tudo do dia
sem esperar por ninguém

não seria essa metade
que não cabe direito nos encontros
que não se encaixa nos bares
que não se conforta na cama

iria mais no quintal
e me alegraria com cada planta
ao invés de serem elas agora
uma beleza intransferível

se eu não tivesse ido
mas fui

se não tivesse visto
mas olhei demais

se não tivesse encontrado
mas me perdi...





segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Da cordis






que presente estranho dado ao corpo é o coração
será uma máquina de fazer a vida
que pouco se percebe, ofuscado pelos olhos
ávidos e curiosos como se tudo fosse o ver?

tem gente que tem o coração nos pés
para a marcha de fazer
para ir adiante
para fugir ou para voltar

tem quem tenha o coração na boca
a dizer tantas palavras
como se inventasse o mundo
e fosse preciso dar nomes a tudo
e vez em quando o contratempo de se calar

se o coração está na mente
será ora lógico, ora estúpido
terá todas as contradições pendentes
e terá que sempre jogar

ter o coração em alguma parte
será esta a que mais passa o tempo
a que no fim define
que fecha os olhos
que se omite
que para e já não permite o pensamento

se tem o coração nas mãos
é bom saber que nem sempre seguram
que às vezes estão vazias
que podem fazer tudo

que nem sempre tocam
e nem sempre são suas





Calendário




como pode ser um Domingo ou Segunda
como se pudesse ser um Domingo ou uma Segunda?
se não os sinto da mesma forma no calendário
se o corpo não é o mesmo Domingo de antes
se de um dia para o outro pode se parecer anos
pode nem sequer ter mudado direito mesmo tendo mudado

chega um dia que é mais que todos outros
o dia do tempo
do giramundo
dia segundo
dia adiado, adiantado

dia que pesa tudo que esperei
que sustenta um longo vão de pisos ornados
lisos, foscos, alinhados, espelhados
dia da medida dos enquadrados

talvez dia de um suspiro
dos barris tapados
de virar a taça
de saber que passa
de mudar a coluna para outro vão

instante que começa outros pisos lentos
a marcha uniforme
do soldado e da causa
da liberdade de costume

e tudo que eu precisava
era do mar

e meus pés descalços na areia...