sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Disma periódica






há muito o que fazer
o que resolver
solucionar essa equação
que parece infinita
com suas incógnitas
suas variáveis...

sempre há coisas para fazer
pequenas, importantes ou banais
cada uma com seu tempo
com suas exigências
com a necessidade braçal
de suas imobilidades

mas aos poucos você vem
no meio, em volta, dentro...
como mínimo detalhe
mesmo que tente ignorar que seja
a chave para religar-me com tudo
até mesmo com as coisas a fazer

momento de um café
com o sabor do café
cheiro, cor de café
e logo você vem
na pequena pausa entre uma coisa e outra
silenciosamente
serenamente
rindo das coisas
do quanto são apenas elas mesmas

e aos poucos percebo
a inevitável presença dessa quietude
da vontade de não pensar em mais nada
quando você vem

hora de fazer outra coisa...
qualquer delas
e sei que é apenas esperar fazendo
esse pulsar de vai e vem

às vezes ali, escondida
quase como calmaria...
ora gentil

e às vezes vem demais na minha vida...






terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Rio















um rio sempre parece tentar se esvaziar
sem nunca ter a mesma água
e mesmo assim, quando vejo um rio,
parece estar sempre ali, o mesmo rio

olhar, olhar o rio
sem parar...

ouvir o rio
imaginar...

correnteza que me pega
flutuar...

às vezes me pego estar como um rio
de águas quentes
correndo nas veias
desconjuntando os braços
todo o corpo

às vezes
apenas um barco
plena represa

às vezes
transbordo...

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Disto





Afinal, que peso tem o tempo?
um "daqui a pouco",
"em breve",
"me dê um minuto",
"já já eu volto..."

que peso tem um dia?
uma noite,
uma lembrança...?

quanto tempo tem uma distância,
ou quanta distância tem num tempo?

quem espera conta cada centímetro...

queria não dizer nada além do olhar
nem medir nada
perder a escala num abraço...

quem sabe parecerá ontem
quando reencontrar...




sábado, 19 de novembro de 2016

Vez




às vezes a gente perde...
apenas
o que seria
o tempo que esperou
o momento que se soltou

por esperar muito de algo
não contamos, senão, com o que queremos
que talvez ordenamos
ou tememos

às vezes não perdemos
mas somos roubados
por um outro desejo
um outro querer
pela liberdade do indesejável

às vezes pagamos o dobro
às vezes a metade
noutras, é como se fosse de graça
ou bem menos do que vale

às vezes percebemos
o valor de um instante
dos dias e dos anos
no reino do tempo

sempre será uma vez
de alguém ou de alguma coisa
de sim ou de não
só não será a única

  

terça-feira, 8 de novembro de 2016

Nova






sim,
seria só dizer uma palavra
uma que mudasse a forma de pensar
que tivesse o maior sentido possível
e repetisse dizendo ela
para ecoar
para que ficasse viva, vibrante
que me aumentasse o fogo dos olhos
que fosse música para o texto de minha vida

que recuperasse sua vocação
algo mais que sua categoria gramatical
no apelo do som que reverbera

que fosse útil como um alimento para um faminto
ou como um banho para fechar os olhos
num desejo de alívio no corpo

uma que dita tivesse corpo, olhos, boca, nariz, mãos
um temperamento e personalidade próprias
que pudesse me fazer companhia como amiga
que eu pudesse pensar ser minha

que desse um nome ao que sinto
para que eu pudesse dizer, finalmente
bem-vinda ao meu mundo





domingo, 30 de outubro de 2016

Leis





lei da relatividade,
os dias são longos para quem espera
e curtos para quem esquece

lei da intransponibilidade,
não há maior distância que a ausência de desejo
de um para o outro

lei da gravidade
o vôo é a marcha do insustentável
brincando de roda

a lei é o que oprime, enfim
minha metafísica
permanentemente...


outro lado




eis o que faltava,
um pouco de música...

enquanto se perde no ar
distraída
lembra a magia perdida
sonora, no estado de ser
entre tudo

mas agora
no ápice dos erros
das dissonâncias dos sons partidos
e rupturas superpostas
abre-se um vale de pausa
quando, enfim, todas essas forças se anulam
para o grande estranhamento
que dá nome às coisas
numa língua sem sabores, apenas intensidades

corpo
máquina de gostos
máquina de sentimentos
incabível
incabível serenidade de um um rosto
ante ao que pensamos ter vivido
apenas a calmaria nesta face do lago
espelho do outro lado
que não é mais profundo que os olhos
nem mais sincero que a pele
aquietando cada parte

apenas um instrumento sem o toque
pronto, mas sem as plumas
para deslizar em suas cordas
e percorrer as curvas dessa escultura humana
lentamente

um pouco de música, por favor
já seria o bastante para um sorriso


sexta-feira, 21 de outubro de 2016

O Pote
















Dona moça
me dá um copo d'água
pra matar essa sede
que não me deixa pensar
sede do tamanho dessa tão comprida estrada

um copo d'água
com o frescor bem parecido
com seu rosto sereno
uma sombra na jornada
um copo pequeno

água limpa dum poço escuro
minada da terra
guardada no pote
de barro vermelho
vermelho bem rubro feito o coração

Dona moça me diga
o que tem no pote
que não importa o tempo
a água é bem fria
vai enchendo um copo por dia
mas fica vazio na escuridão

Dona moça, obrigado
já volto à jornada
mas a sede não passa

Sinhá moça, sei
agora levo comigo
da água, o frio
do pote, o vazio
do tempo, o caminho
mas a sede não passa...







sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Pavio


















onde é o lugar,
para aonde subiram os ares do tempo
que o dentro e o fora permaneciam imersos neles
e sabíamos que estávamos neles
pelo incontinente sorriso no rosto e olhar
e por tão leves estarem nossos corpos e almas?
tão desarmados e dispostos
a brincar nesse quintal mundo
extremo oposto da escola
da sala, da sela

brincar de nada dizer ou fazer ao certo
apenas ter o outro ali
única regra válida do jogo
inventando novas regras
para logo esquecê-las
invertê-las

como pode hoje estar o outro ali
sem a ventura
educado, marcado
armado em pensamentos
empenhado em ganhos
a manter única regra densa
vestido, coberto
amedrontado e protegido
encenado

como pode nestas águas
ser escafandrista,
neste sol, estar sob um teto
ou não saber o vento
por trás da janela?

pobre desgosto
nem sabe virar o tempo
permanece revestido de sua segunda pele
esperando um acaso
um amor, talvez
para acender este pavio










domingo, 25 de setembro de 2016

Dois mundos





te passo nessa travessia
com olhares estradeiros
ruminantes e cansados

miro esse sombreado
e deixo o vento suspirar no rosto
alívios breves

os silvos na galharia
deslizam como dedos nos cabelos

meus pensamentos, estes rebanhos soltos
precisam descansar em tempos
também meus joelhos, rotos
desta caminhada

depois me erguer nesta campina
quase como um tronco
mesmo ressequido
como se tivesse cem anos passados
e tudo esquecido...

dois tempos perdidos
dois mundos, lado a lado
destemperados
guardados na quietude
entre a árvore e o viajante
entre o ali e o adiante...









sábado, 3 de setembro de 2016

Temblor





e foi escrito nas paredes
estes livros abertos
com tantas histórias
estes livros fechados
de memórias desbotadas

muitas sombras dançaram levemente
desformes, se misturaram
sem que possuíssem as cores
pulsando seus pincéis 
na inconstância dos dias claros
e nos embalos dos luminares noturnos 

muitas portas se abriram
para além do quarto
para dentro e para fora
para as ruas da cidade
outras se fecharam
e perderam os trincos

vida sem teto
com cores de frio e calor
casa do acaso
palavras varridas pelo vento

as sombras dançam agora nos becos
umas sempre no mesmo lugar
no mesmo caminho
outras breves manchas sujas
nas roupas do andante

se assombram corpo a dentro
no desmoronado instante
na pluma das mãos tangidas
um espalmar florido 
dum entulho sobre o papel










sexta-feira, 26 de agosto de 2016

murmúrio






quem são estes leitores?
que buscam entender ou deleitar-se no conforto do belo
na ressonância de versos que venham a parecer deles
coincidindo com as palavras presas
pela censura mordida para não cantar suas canções?

que coro mudo é esse de corujas murmurando
regido pelo medo de entoar a voz
para não descobrirem sua espécie
como se o mundo fosse feito para aves canoras?

que música cantarão
in cuius tonis
em que língua ressonarão seus sentimentos
em que andamento andarão?

quem lê teme saber todos os verbos
saber bem demais
ter vestido um deles
e retirados da conjugação

cantarolar no banheiro
fazer do eco espelho
achar o tempo, o andamento
improvisar...

só sabe ler quem cantarola
pois sabe o valor das pausas
e até mesmo esses tempos mudos
pulsam no coração







sexta-feira, 19 de agosto de 2016

O apanhador




era assim...
quando o sol se punha na baía
infestando de ouro as paredes
ardendo cores quentes
despertando sombras inacabadas
como histórias mal contadas

um ouro que nenhum rei tiraria
que em nenhum ombro pesaria

manchas do tempo imperfeito
perdidas no portal de um crepúsculo
encantador de olhares
a diluir pensamentos
quando suave no rosto

era assim
redesenhando a cidade
enchendo os ares
lançando a calma
sobre todas as coisas

o belo chega sempre como a tarde
breve e imenso
e passa esmaecendo
como arte que se rebela
deixando as telas vazias

mesmo o sol, esse pintor arredio
não pode me levar esse instante visionário
de meus olhos fechados
nem sabe que o roubei

guardo e não me pesa
nem perderei

é assim...














segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Mot




até parece que vem de fora
o que embala os motivos quentes
que antes eram plantados na alma
e hoje são pousos breves

de fora ou de qualquer lado
até parece que se espera
algo vir, acontecer
cair do céu
como se o mundo fosse conspirador
dos destinos repentinos

dentro se cansa da espera
desconfia e se cala
suspeitando já ser tolo
o inventar a vida

tal como um desejo cansado
que não se finda e nem sabe se manter
não se acerta, rancoroso

até parece que é em algum lugar do corpo
ou nele todo
que fica engavetado
esse rascunho louco
sem se manifestar

ao menos ele está
enquanto a impermanência o desafia
e o ridiculariza
como se fosse isso uma vitória
colecionando cansaços

talvez a alma também precise de descanso
depois desperta...

quando? não se sabe
apenas sei que seria bom
se fosse como uma noite de sono





quinta-feira, 23 de junho de 2016

Tabuleiro





ao menos tente seguir
quando o vasto mundo se esvaziar
e tudo não te fizer mais aquela companhia

quando perder a graça
dos pequenos sorrisos
e tiver a alma embaralhada
com o corpo insistindo no ainda
sem a surpresa dos arrepios

ignore o vazio
esse companheiro repulsivo
querendo encher os pensamentos
com línguas mortas e sabores frios

melhor lembrar, talvez
de quando estar era intenso
em qualquer coisa

lidar, enfim
com a porção exata de ser alguém
com o espaço incalculável que ocupa
o único pertence
ora peso, ora ventania

quem sabe, viver é sorte
e esse momento é só mais uma rodada
que não deu em nada


sábado, 4 de junho de 2016

modal subjetiva



assim ficou o mundo
estranho, mudo, zombeteiro
poluindo os ares dos inspiradores
com o plasma inodoro do hoje

fadiga que embebeda
estranha natureza decompondo-se
se recompondo talvez
por ser natureza

e o possível, esse compositor
com uma estranha mania
abre-se demasiadamente
para a inconsistência

compositor irônico
se ri das melodias
jaz a harmonia
na simples incompatibilidade
entre a física e a matemática

tem o tom da pedra
o peso da queda
o voo da folha seca

estranha canção sem alma
seria esnobe demais se chamar arte
hipócrita demais se dizer nada

por enquanto
melhor não perder o ritmo
por ora
melhor manter o quaternário

vai restando viver de improviso...


quarta-feira, 4 de maio de 2016

À minha volta




é preciso, depois de um bom tempo
voltar ao meu lugar
antes que eu vista uma outra roupa
que me confira um ser além do meu
uma roupa que sempre será oca
por mais que a ocupem
por mais que a passem
de geração a geração

voltar, talvez mais pesado de pensamentos
de saberes com permissões outras
com vontades envelhecidas
com a suspeita sobre as novas possibilidades
e com a dúvida se me cai bem por dentro
tentando aceitar ser isso merecido

inevitável, porém, o desejo rendeiro
que além do necessário, celebra
invenções de tramas em minha carne
corpo que se entrega feliz ao vestido das águas
a uma outra pele e a todas as texturas
para o frio
para os olhos
para o sol

ter em volta o desvelo
não saber onde é a ponta do fio
na arara de sonhos
escolher roupas leves
que não me tornem tanto

voltar com todos os cabides
pendurados nos ombros erguidos
com a alvura de seus linhos
cruzando os caminhos
para o nu tamanho escondido





sábado, 23 de abril de 2016

Falamento





partido ao meio
em partes desiguais
mal partido
feio
num só golpe
por trás

batido
quebrado e cuspido
no prato que comeu
pai, avós, marido
cunhado que apareceu

Bolso vazio
Furado
gritando por um tostão
descalço
na calçada
moeda de lados planos
sem coroa, com a cara no cão

é caro
é descarado
socado, metido
temido com cunha na mão

é ato encenado
é certo, é errado
sim e não
é soco pesado
no olho da união






domingo, 20 de março de 2016

Decantos





limpa meu olhar
pra eu descansar sua imagem
e banhar essa paisagem em águas quentes
enquanto o verão esfria
nos meus cuidados invertidos
e abraço os outonos
feito velhas roupas macias

decanta meus pensamentos
ao fundo de meus mares
objetos perdidos acolhidos
por areias finas e cristalinas
levita-os sobre essas nuvens lentas

os instantes são como esses pedaços perdidos
na separação das águas
elementos que buscam seus pesos
plenos de voo e queda
rastros de uma vida errante

e não sabemos mais vê-los
para o desespero dos sentidos
tendo-os todos juntos e perdidos
na esteira turva que assenta agora

se se confundem nessa constelação de cores
deste auto-retrato que se transforma
se não sabemos qual é o sol ou a lua
o minguante ou o crescente
se nos espanta o piscar de estrelas
nestes olhos cadentes

basta vermos que os céus e seus infinitos
com tantos corpos perdidos
com tudo tão longe e tão presente
é pequenino reflexo da poeira da gente





segunda-feira, 7 de março de 2016

corpo e mundo



porque é no corpo que passo
me peso, gravito
me insiro no espaço
e nem sempre sei conciliar o ser com ele

nele é que me faço entrar
ser movimento mudo
recolhendo delicadezas e dores
guardando sabores e repulsas
arrepios e murmúrios desarrumados
nos bolsos internos

ele me despe para o mundo
e me torna ele
me faz estranhar, desumanizar
me lança para longe
desmonta, me perde

às vezes consigo reencontrá-lo
e ser cúmplice em qualquer investida
às vezes consigo tocá-lo
ser cavalo e homem
espada e coração
às vezes ser nada ou ser uma liberdade incandescente

às vezes nem sei o que fazer com tanto
com tudo o que não serve em um momento
este corpo educado devia saber que não cabe
devia saber perder ou apenas permitir isso
isso é quando não se sabe se é ele ou nele

é preciso apenas ser amigo do mundo, talvez
cada vez mais íntimo
amigo do corpo e do mundo
amigos nunca têm uma razão de ser
basta saber que existem
basta reconhecê-los
melhor não saber muito sobre esses amigos
apenas ir com eles
porque é melhor passar assim














quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

monólogo






estava escrito
e vi desmanchar parte a parte
numa ventania de vapores
de tintas sedentas na areia

o outono desfez a carne
oca a armadura da inconformidade
ainda de pé ecoando uma paisagem exaurida
que renasceu envelhecida

as sementes já não incandescem o mundo
pois se romperam no deserto
nem há mais cavalos de puro sangue
voadores velozes nessas dunas

os vinhos ficaram claros
com o sangue azul
as taças ficaram rasas
emborcadas nesse mundo avesso
e nem produzem mais o som
com o roçar dos dedos em seu lábio molhado

e essas tonturas sem torpor
não entendem nem são companheiras
nem consolam os bebedores
acostumados a afugentar a mente
e a sorrir na tragédia dos rostos
justificando razões insensatas

o mundo embriagou-se de vez de um estranho senso
se inundou de um plasma insípido no céu da boca
entalou-se com suas torres
perdeu o coração do tempo
entrou casa adentro

pior companhia não há
para esse monólogo do desejo







segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

entreposto





diz o meu contrário
e estranho qualquer forma de entender

por fora é só um quarto e coisas
por dentro é só uma vida

nesse entreposto pareço estar à beira
já fora de lugar
evitando saber o que transpôs primeiro
e o que ainda é o outro lado

os sentidos tentam violar o rosto
livro fechado lapidando sombras
que parece estar inteiro
mas que conhece o delírio de portas abertas
palavras sujas
e as línguas de fogo

a melhor forma de se voltar é ir embora
ter os princípios sem fins
saber o gosto invertido
rasgar os escritos para permanecer os verbos
desdobrar as certezas e ver o que sobra

mergulho breve
enquanto as roupas secam
sente a lama da pura inconsistência
e as marcas de um corpo vadio

por dentro tantas estantes ainda vazias
por fora um pequeno abrigo







terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Andar






de súbito, andar...
a rua é um convite sem motivos
andar talvez seja a única razão
de andar por andar
sem caminho seguro

a vida não acalma na noite
nem o sono nos ensina a acordar
por isso é preciso às vezes
fazer o que fomos feitos para fazer
com os olhos, com os ouvidos
com as pernas
mesmo que o pensamento insista
em se manifestar
para que isso seja uma condição
de estar vivo

educa este desesperado pensamento
com passos bem tranquilos
e faça o coração bater sem caminho traçado

deixe lá os sentimentos densos
vá com os mais leves
ou então os leve todos
pra passear
pra tomar sol e ficarem mais bonitos

andar generosamente
com tudo o que está escondido
dar pernas ao que está preso
pra sair do lugar onde está cravado
ponha-os para correr um pouco
e brincar de pega-pega

anda assim
com janelas e portas abertas
deixe sair e entrar

andar assim
sem ter que andar assim




sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

almada




olhar no olhar
que te repensa convergido
recolhe as tuas passagens
no relâmpago da vida
nos clarões que desvelam
coisas queridas
coisas temidas

sem encenação
sem os ensinamentos
se ajunta e filtra na areia

alma pura
terna ou má
animada e apreendida
alma que é fera
que sabe responder
pois sua língua saliva
molha

alma sua
imponderável onde habita
onde repousa
onde se comprime
onde se esconde e se guarda

exala seu vapor
sua neblina
nos horizontes da carne